Num documento tornado público pela Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), o bispo D. Bruno Ateba, da diocese de Maroua-Mokolo, se queixa que a violência perpetrada pela organização terrorista Boko Haram no norte da República dos Camarões, está sendo em grande parte ignorada pelo mundo. “O que ocorreu em Paris durante os ataques é algo que nós sofremos aqui todos os dias e no entanto, ninguém no mundo diz nada sobre isso”.

Apenas na sua diocese, desde o último trimestre de 2014, nada menos que dois funcionários da Igreja, três catequistas e cerca de 30 leigos católicos foram assassinados. E além disso, houve numerosos raptos.

Entretanto, não foram apenas os cristãos que foram afetados pelo terror, afirma o bispo, pois muitos muçulmanos também foram vítimas. Em muitos lugares, mesquitas foram incendiadas e lideres foram degolados porque “se recusaram a seguir as ordens do Boko Haram”. Desde o começo, em dezembro de 2013, a comunidade nativa muçulmana dos Camarões tem adotado uma posição cada vez mais forte contra o Boko Haram, afirmando que o grupo não tem o direito de se denominar muçulmano. De fato, com frequência, muçulmanos tem se oferecido para ajudar cristãos em momentos de perigo. Na verdade, diz o bispo, o islamismo tem mudado muito nas últimas três décadas no norte da Nigéria e dos Camarões. Essa mudança pode ser atribuída à influência de correntes islâmicas salafistas e wahabitas, que são promovidas e apoiadas pela Arábia Saudita e mais recentemente, também pelo Qatar. Como resultado, mais e mais estudantes estão sendo enviados para estudar na Arábia Saudita, no Sudão e no Níger.

Não se deve esquecer que estas correntes islâmicas, especialmente foram as que “produziram organizações terroristas como a Al Qaeda, a Al Nusra, o Estado Islâmico, o Boko Haram e outras. E são elas que as nutrem. Este reformismo se transforma em islamismo radical, quando adota claramente um plano político para erguer uma sociedade islâmica”. No norte dos Camarões, a comunidade muçulmana ainda não cruzou esta linha de adotar um plano político de impor uma sociedade islâmica aqui. Pelo contrário, tem havido um número cada vez maior de reuniões inter-religiosas entre cristãos e muçulmanos. “Nós estamos sofrendo junto com eles”, escreveu o bispo.

Já num passado recente, o Boko Haram usou as vilas do norte dos Camarões, situadas na fronteira com a Nigéria, como lugares de esconderijo para os terroristas que fugiam das retaliações do exercito nigeriano. Com o passar do tempo, mais e mais armas foram contrabandeadas para a região. Além disso, em 2013, membros do Boko Haram conseguiram, durante as eleições, obter fraudulentamente documentos pessoais como se fossem cidadãos dos Camarões. Eles agora os utilizam para escapar dos controles do governo e assim poder atuar livremente por aqui. Outro aspecto preocupante é o fato que muitos policiais locais são corruptos e estão dispostos a emitir documentos de identidade falsos mediante o pagamento de propinas, que correspondem de 5 a 7 vezes o custo da taxa normal. O resultado disto é que “qualquer pessoa agora consegue encontrar um caminho para atuar em nosso país”, explica o bispo.

Um dos sinais precursores de que as incursões terroristas iriam se espalhar, foi o rapto de uma família francesa em fevereiro de 2013, seguida em novembro do mesmo ano, pelo rapto de um sacerdote francês, o pe. Georges Vandenbeusch. Desde julho de 2014 os ataques tem sido quase incessantes. Sobretudo entre 24 de dezembro de 2014 e 8 de janeiro de 2015, “não houve um só dia em que a paz tenha prevalecido”. Homens fortemente armados, viajando em grupos de três ou quatro em motos tem semeado pânico na região. O povo tem observado um certo grau de profissionalismo nestes bandidos, diz o bispo. O uso de minas terrestres, a partir de outubro de 2014, marcou uma nova fase na estratégia de terror.

Outro grande problema é a estratégia do Boko Haram de recrutar crianças de cinco a quinze anos por meio de ajudas financeiras às suas famílias, ou simplesmente raptando-as e forçando-as a servir como bucha de canhão, afirma o bispo. Segundo informações chegadas ao conhecimento do bispo, a partir de dezembro de 2014, em poucos meses, nada menos que 2.000 crianças e adolescentes camaroneses foram pegos à força pelo Boko Haram, inclusive um certo número de meninas.

A infraestrutura da região afetada – que é uma das mais pobres do país – foi severamente afetada. Segundo o bispo Ateba, os ataques terroristas causaram o fechamento de 10 escolas, 13 centros de saúde e muitos postos policiais foram destruídos. Mais de 55.000 pessoas são atualmente refugiadas apenas dentro da diocese de Maroua-Mokolo. Muitos encontraram abrigo com parentes e conhecidos, mas há mais de 22.000 pessoas ainda se escondendo nas matas. A situação é particularmente grave em Amchidé, onde uma série de ataques do Boko Haram fizeram com que toda a população fugisse. Como resultado, toda a atividade pastoral na região teve de cessar completamente. Uma capela foi incendiada e segundo testemunhas, há caveiras humanas jogadas nas ruas. A população local inteira fugiu da região, mas seu número foi aumentado por milhares de outros refugiados que fugiam do Boko Haram na Nigéria.

O bispo Ateba emitiu um apelo ao mundo – “Hoje nós pedimos sua atenção, suas orações e sua ajuda. Ajudem-nos a trazer um fim a esta brutalidade inominável que está destruindo toda a esperança de um futuro e todo o trabalho duro de gerações de fiéis”.

Ao mesmo tempo ele elogiou a coragem dos fiéis que continuam a se reunir para rezar, apesar do perigo e do medo. “Eles são como vaga-lumes que iluminam as trevas da noite”, ele escreveu.

A AIS se propõe a ajudar a diocese com cerca de 45 mil reais na construção de um salão multi-uso onde os 5.200 católicos do campo de refugiados de Minawao poderão se reunir para rezar, participar da Santa Missa e estruturar um novo recomeço.

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Um comentário

  1. Carlos Roberto Gonçalves 10 de junho de 2015 at 19:58 - Responder

    A bestialidade humana sem fronteiras não destruirá o amor de Deus pelos seus filhos amados . Onde a semente do amor de Jesus foi plantada haverão muitos bons frutos, é só cuidarmos.

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